terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

VIDA

Quando acordo todos os dias, não tenho mais o tempo que se foi. Agora é um novo dia, uma nova aurora que recebo de presente para novamente recomeçar um ciclo que embora pareça não ter fim terá, mas este fato ignoro, pois o presente inigualável de abrir meus olhos para viver mais 24 horas de um dia.
Vou aos poucos me levantando, e aí já começo a fazer algo que faço quase que por programação, contra a vontade de mim mesmo, mas que aceito com naturalidade: rotina. Somos reféns dela, todos nós, quer queira ou não, a cumprimos religiosamente, com fervor, e nos empenhamos em fazer isto. Cumpro então a rotina de todo dia na manhã que me recebe em seus braços enigmáticos, pois o dia ainda está começando, não sei o que me reserva, que cheiros sentirei, que gostos provarei, onde porei o pé, tudo isto ainda é um mistério tão grande quanto aqueles que a Ciência não consegue resolver.
E não estou aqui falando sobre rotina de trabalho somente, nossa vida inteira se tornou uma rotina, e te digo que realmente é verdade. Pois após levantarmos, fazemos higiene pessoal e tomamos café. Ao preparar nosso café, pensamos colocar nossas preferências, nossos gostos, naquele café que estamos prestes a tomar, mas nisso há rotina: pois você sempre toma café daquela maneira, do mesmo jeito, numa mecânica absurda, o que é grave. Até na hora do banho temos rotina, não podemos nos dar ao prazer de ficar embaixo d’água para simplesmente sentirmos  o frescor dela, temos tempo pré-determinado para isso, ou então somente não queremos ficar ali, temos que ser pró-ativos e ativos sempre, e ficamos assim até quando não precisamos ser.
Isso tudo sim é gravíssimo, se considerarmos que a vida é breve, é finita, e seja lá em qual religião você esteja, há de concordar que somente Deus pode nos tornar eternos e isso é fato, mas pensando na nossa condição humana somos findáveis, do pó viemos e ao pó voltaremos, isso é inevitável e é a única certeza que o ser humano tem de fábrica, já desde que nasce: a certeza de que um dia morrerá. Claro, se pararmos para pensar nisso ficaremos malucos, até porque o ser humano teme tudo aquilo que ele não entende, e a morte com certeza não entendemos, por isso á tememos, e não gostamos de pensar nela, somente aceitamos o fato e tentamos encaixar na nossa cabeça que ele não vai acontecer. Então, partindo dessa primissa, posso dizer e afirmar que estamos desperdiçando nosso tempo aqui nesta terra, e desperdiçando cada momento pequeno, pois pasmem, as coisas mais especiais estão nos momentos mais simples, aqueles aos quais nós não damos a devida importância.
Como minha professora de Adm costumava dizer, há diferença entre quem prepara arroz e quem faz arroz: quem prepara arroz pega duas pás de arroz, coloca no lavador, lava, pica 2 alhos, óleo, frita o alho, coloca o arroz,espera dourar e depois põe água. Depois de seco, serve. Mas aqueles que fazem arroz, sim, fazem tudo isso, mas no fim colocam uma salsinha recém colhida da hortinha do fundo do quintal, no outro coloca milho, ou seja, faz o mesmo serviço mas com um toque á mais, e isso mostra que dá importância ao simples momento de preparar um arroz, para que ele seja especial.
Descartes disse: “´Penso, logo existo”. Concordo, mas hoje em dia a humanidade não tem pensado, somente existido, não tem parado para contemplar as coisas da vida, as coisas simples, e você pode até se perguntar porque não cito as grandes, não o faço porque elas hoje em dia estão sempre em evidência e são com vigor buscadas: fortunas, luxo, status. Tudo isso faz o ser humano se sentir grande, e isso não é de sua total natureza, foi imposto com sutileza pelo capitalismo, que pontua o ser como menos importante que o ter, e quem tem é visto, é notado, e como nosso ego gosta de ser massageado, procuramos sempre ter, e isso pode se tornar a busca de uma vida, não pensando em algo bom ou em outros, mas em si mesmo, um egoísmo justificado no simples prazer pífio e passageiro que esta situação possa trazer.
Não estou eu aqui falando de teoria da pobreza e nem de teoria maluca de prosperidade, e nem sou contra quem é rico ou quem pode ter um Land Rover  na sua garagem, e diga-se de passagem até eu queria um [risos]. Mas o que digo é que devemos começar a parar e ver nas pequenas coisas a beleza da vida, pois estamos deixando isso passar. Nesta altura, você caro leitor já deve estar se perguntando: Ora, ele falava de rotinas, e já falou de capitalismo e de ter em detrimento de ser, o que estas coisas tem a ver? Explico. Nós fomos CONDICIONADOS a buscar o ter, buscar as coisas, e isso para nós se tornou normal, se tornou algo fundamental, e aquilo que interessa, as pequenas coisas, como brincar com filhos, se tornou secundário, não está na rotina do ser, é algo que deveríamos dar total importância, mas que “passa batido”. Isso pode gerar conseqüências terríveis, e já estamos sentindo algumas delas, como os nossos filhos, que hoje em dia saem de casa, tem de se inserir numa tribo (Family Diamonds, EmoCore, Góticos, etc) para acharem sentido para suas vidas, bebem, usam drogas cada vez mais cedo, nada contra, mas com 14-16 anos não há estrutura para isso, e se eles se rebelam desta forma, pois sim, é uma rebelião, um protesto contra aquilo que eles vêem como errado, vejam só, os filhos ensinando os pais de um lado e fazendo errado do outro.
O fato supracitado mostra claramente o que digo, mas outro exemplo são os divórcios, cada vez mais constantes, que ocorrem com menos de 1 ano de casamento, o que demonstra que que os casais não tem mais tempo nem para si, não podem ficar juntos na cama, somente pelo simples fato de estar juntos, pois o tempo é curto, temos de faturar, temos de isso, temos de aquilo, agora coloco outra verdade que acredito: o homem é escravo do seu relógio.
Como diria Antonio Marcos: “Quem dá mais por um velho ultrapassado que ainda crê no amor”, isso é algo que se perde hoje, por causa de tudo que já citei, e o amor precisa ser regado, cultivado, mas as rotinas são obstáculos até para isso. Vocês podem ficar espantados com o que vou falar, mas é um absurdo casais não gastarem pelo menos 1 min se beijando. Ontem vi um casal no terminal urbano, um funcionário da empresa e uma moça, já de uns 30 anos, se beijando calmamente, apreciando aquele singelo momento, e isso me tocou profundamente, eles entendiam que as coisas podiam esperar, que tudo que ocorria ao redor era secundário naquele momento, pois ali somente eram os dois celebrando o simples fato de estarem juntos, e gastando tempo entre si, gastando não, investindo tempo. E em volta, pessoas andando apressadas, num contraste que só vi em Gernica de Picasso, mas aquilo foi lindo em minha opnião, aquele casal dava uma lição preciosa para todos aqueles que a quiseram compreender, de que devemos sim parar de vez em quando para apreciar as coisas belas da vida, e simples, pois não creio que precisemos de muita sofisticação para um beijo.
Finalmente precisamos ter um cuidado especial com as coisas pequenas da vida, com os momentos simples, como o citado acima, pois são eles que fazem realmente a diferença na nossa vida, que marcam nossa passagem aqui e que nos trarão a felicidade que tanto procuramos, e falo isto porque se dinheiro fosse a felicidade, não haveriam milionários que se suicidariam ou que tivessem síndrome de pânico. Um exemplo de pessoa que consegue valorizar as pequenas coisas, pasmem, são os idosos. Hoje em dia são espancados, maltratados por gente que na minha opnião nem deveriam se chamar gente e sim animais, mas os idosos conseguem fazer em síntese o que digo. Eles vivem dia pós dia com calma,sem pressa, o relógio agora vira parceiro, recebem cada dia como um presente esperadíssimo, rotinas não mais existem, agora a preocupação é curtir a vida, andar de mãos dadas, ver a beira-mar, etc.
Se aprendermos esta lição, acredito iremos ser muito mais felizes, e no fim da vida teremos a certeza de que soubemos viver.
“Pensamos no dia somente como um período de duração pré-determinada, como algo automático, mas não! Não quero viver a vida como uma rotina, mas como uma sensação renovável.” – Rafael Leal Santos

Sir Ringo Starr

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